Lei anti-Oruam: até onde a letra é arte e quando vira apologia

Oruam ficou em evidência nos ultimos dias após vereadores protocolarem um projeto de lei de nomeado de "lei anti-Oruam"

atualizado 24/02/2025 18:45

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Foto colorida de homem, Oruam com tatuagens e de cabelos presos - Metrópoles Reprodução/ Instagram

As recentes polêmicas envolvendo o rapper Oruam colocaram o cantor em evidência nos últimos dias. O artista carioca ficou a tarde da última quinta-feira (20/2) detido na delegacia após ser abordado em uma blitz da Polícia Militar na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro. Além disso, o filho de Marcinho VP, líder do Comando Vermelho, também está no centro das atenções devido ao projeto de lei nomeado de “Lei anti-Oruam”.

O PL levantou questões sobre a linha tênue entre liberdade artística e apologia. Historicamente, gêneros como funk e rap retratam nas letras das músicas a realidade dos artistas, que em muitas vezes cresceram na periferia e tiveram o crime como uma realidade palpável.  O advogado e mestre em direito penal pela Universidade de Brasília (UnB) Pedro Porto esclarece que é impossível chegar a um definição de arte universalmente aceita, o que dificulta uma conceituação jurídica exata sobre o que é a liberdade de expressão artística, assegurada no art. 5º, IX, da CF.


O que é apologia?

  • Apologia ao crime consiste num incentivo, num estímulo consciente à repetição de uma prática criminosa. Ou ainda, num elogio ao criminoso por ter praticado a ação criminosa, por sua competência ou motivação na execução do crime.
  • A pessoa que pratica a apologia ao crime visa instigar efetivamente a repetição de uma prática criminosa.

Para Porto, a expressão da arte pode ser crítica, polêmica, até mesmo agressiva na visão de determinados grupos, sem que isso configure um incentivo direto à prática criminosa.

“Não é a mera menção a determinado crime numa música, nem mesmo a defesa de alguma figura criminosa que implicará o crime de apologia. Até mesmo o elogio a determinado atributo de um criminoso não é suficiente para se configurar tal crime, exemplo: um filho que fala de como o pai, preso, era importante, dedicado à família e é vítima de uma injustiça”, aponta o advogado Pedro Porto.

O especialista em direito penal analisa que para diferenciar liberdade artística de apologia é preciso questionar se a obra artística produzida e publicada pelo artista visa instigar a prática criminosa ou enaltecer determinado criminoso pela execução de determinado crime. “Proibir antecipadamente determinada manifestação artística, especialmente por meio do direito penal, é censura prévia não admitida no direito brasileiro, como já tratou o STF no julgamento da ADPF 130. O art. 220 da Constituição Federal apresenta mecanismos alternativos à censura prévia, como direito de resposta, pretensão indenizatória e, até mesmo, a posterior remoção de conteúdo”, afirma.

Visão distorcida da música

Com diversos artigos escritos sobre censura na música, o professor de musicologia Carlos Palombini explana que a tentativa de criminalizar a arte se baseia em ideias ultrapassadas e em uma visão distorcida do papel da arte. O especialista esclarece que a visão de que o artista expressa sua verdade pessoal em sua obra vem de uma ideia antiga, do século XIX, em que se acreditava que a música era um reflexo direto das experiências do compositor. No entanto, ele explica que a arte é, na verdade, uma representação, e o artista pode assumir diferentes personagens em sua música.

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Oruam foi preso nesta quinta-feira (20/2)
Lei anti-Oruam: projeto começa a tramitar na Câmara do Rio de Janeiro
Oruam ficou em silêncio durante interrogatório após ser preso no RJ
Oruam é filho de Marcinho VP, preso e condenado por tráfico de drogas e homícido
Na sequência, o rapper aproveitou para fazer um questionamento nas redes sociais
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Oruam, rapper preso no RJ, foi indiciado por dois crimes; saiba quais

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Oruam foi preso nesta quinta-feira (20/2)

Reprodução/Instagram @oruam
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Lei anti-Oruam: projeto começa a tramitar na Câmara do Rio de Janeiro

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Oruam ficou em silêncio durante interrogatório após ser preso no RJ

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Oruam é filho de Marcinho VP, preso e condenado por tráfico de drogas e homícido

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Na sequência, o rapper aproveitou para fazer um questionamento nas redes sociais

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Oruam

“Isso é comum, por exemplo, no proibidão, estilo de funk em que o MC pode dar a voz a um assaltante ou chefe do tráfico sem que isso represente suas próprias ações ou intenções. O problema, é que muita das vezes as letras são tiradas de seu contexto e usadas como prova judicial, como se fossem confissões de crimes ou manifestações de apoio a atos ilegais, desconsiderando o fato de que o funk ou rap é uma expressão legítima de arte e também de crítica social”, destaca Palombini.

O especialista em musicologia acredita que transformar essas manifestações em crime seria inconstitucional, já que a Constituição Federal de 1988 proíbe qualquer outro tipo de censura prévia. No entanto, Palombini alerta o risco da autocensura, “A simples ameaça de ser processado pode fazer com que artistas evitem abordar certos temas, prejudicando a liberdade de criação e empobrecendo a diversidade cultural”, disse.

Além disso, o especialista aponta que a aprovação de leis que tentam censurar artistas pode prejudicar diretamente a liberdade de expressão e também limitar o mercado cultural, criando dificuldades para que músicos sejam contratados ou consigam realizar shows. Na visão de Carlos Palombini, o verdadeiro desafio é compreender que a arte não deve ser tratada como um reflexo direto das ações ou intenções do artista, mas sim como um espaço de representação simbólica e de crítica social.

“Criminalizar essas manifestações não resolve o problema da violência e ainda ameaça um dos direitos mais fundamentais em uma sociedade democrática: a liberdade de expressão”.

Sobre a lei anti-Oruam

No Rio de Janeiro, os vereadores Pedro Duarte (Novo) e Talita Galhardo (PSDB) apresentaram, no último dia 17, projeto de lei que visa impedir que recursos públicos sejam utilizados para financiar shows e eventos abertos ao público infantojuvenil nos quais haja expressões que incetivem o crime organizado.

Em janeiro, a vereadora Amanda Vettorazzo (União Brasil) apresentou um projeto semelhante na Câmara Municipal de São Paulo. No Congresso Nacional, o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil) também protocolou um PL com o mesmo objetivo, mas voltado para contratos do governo federal.

O nome “lei anti-Oruam” faz referência ao cantor, filho do criminoso Marcinho VP, que ficou conhecido por músicas que abordam temas como tráfico de drogas e crime organizado.

 

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