Dois carros pertencentes ao suspeito de matar a vendedora Noélia Rodrigues de Oliveira, 38 anos, foram encaminhados, nesta sexta-feira (25/10/2019), para a perícia do Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). O Chevrolet Cruze e o Corsa de Almir Evaristo Ribeiro, 43 anos, serão analisados para a coleta de mais elementos que possam ajudar os investigadores a traçar a dinâmica do feminicídio.
Os policiais da 38ª Delegacia de Polícia (Vicente Pires) ainda fazem diligências para tentar encontrar a arma utilizada no crime e a bolsa de Noélia.
Vizinhos em choque
Após o último dia 18, data em que o corpo da vendedora foi encontrado, a quietude tomou conta da Chácara 117 do Sol Nascente, onde Noélia residia. Morando em frente à casa da vítima, a família do suspeito de cometer o crime, agora, sai de casa com a cabeça baixa, segundo moradores do local.
Aposentado, Antônio Fernandes Barbosa, 84, vive na rua há uma década e conta que o feminicídio foi um choque para toda a vizinhança. “Nós a conhecíamos desde que formou isso aqui, porque viemos todo mundo junto para cá. Então, foi um caso que entristeceu a gente, porque todo mundo da rua se conhece. Estamos todos de boca aberta”, relatou.
De acordo com Antônio, o operário de máquinas Almir Evaristo “era um cara supernormal” e que sempre se mostrou educado com os vizinhos. “Ele era trabalhador. Ninguém esperava por isso”, disse.
O Metrópoles esteve no local, nesta sexta-feira (25/10/2019), e tentou conversar com parentes do suspeito. No entanto, uma mulher que foi identificada por vizinhos como esposa do operário não quis falar com a reportagem.
Colega de Noélia, Fernanda Gomes, 22, mora em frente à casa da vítima há nove anos e se relembra da vendedora como uma mulher “sorridente e alegre”. “A gente saía de casa às vezes e a víamos sentada em frente ao portão. Hoje eu olho e ainda imagino ela ali. Uma tragédia”, lamentou a amiga.
Vivendo ao lado da família de Almir, a estudante Lorrany Gomes, 20, contou ter ficado abalada com a notícia de que o operário seria o autor do assassinato. “A gente passava na rua e ele falava com todo mundo. Sempre dava bom-dia, boa-tarde. Quando ficamos sabendo que foi ele, ninguém acreditou”, narrou.
Ao falar sobre Noélia, a estudante não deixou de destacar o jeito descontraído da colega. “Ela era uma mulher superdivertida, vinha aqui para casa no final de semana. São tantos casos de feminicídio acontecendo. Não é possível isso”, afirmou.
Segundo ela, a rua do Conjunto G da região sempre foi tranquila e movimentada. Após o óbito da vendedora, encontrada morta no Assentamento 26 de Setembro, em Vicente Pires, o clima entre os moradores mudou. “Todo mundo se fala aqui. As crianças sempre brincavam fora, o pessoal conversava. Agora, todo mundo fica dentro de casa.”
Marido defende esposa
A descoberta do assassino de Noélia provocou reações distintas no marido da vendedora, Marcos Paulo Mendes Santana: surpresa, decepção e alívio. Oito dias após a morte da esposa, ainda em luto, ele tenta consolar os filhos e diz estar empenhado em defender a reputação da mulher: “Estão difamando a imagem dela. Era uma ótima esposa e excelente mãe. Vejo comentários horrorosos de pessoas que parecem não ter humanidade alguma”, desabafou.
O vigilante se refere aos comentários em redes sociais após investigações da PCDF sugerirem a hipótese de que Noélia mantinha um relacionamento extraconjugal com o suposto autor do feminicídio. “Primeiro, não acredito que os dois tivessem um caso. Quem a conhece sabe que ela não seria capaz. Segundo, mesmo que essa hipótese se confirme, nada justifica tamanha maldade”, disse.
Marcos Paulo ressalta que o processo todo tem sido doloroso e difícil, e que o filho mais velho, de 16 anos, é o que mais tem sentido a barbárie cometida contra a mãe. “Ele já entende mais e está desolado, sofrendo muito. A família está unida e se ajudando para que os filhos não cresçam traumatizados.” Os outros dois filhos do casal têm 9 e 5 anos.
Assassino desejou pêsames
Ao tomar conhecimento da prisão de Almir como principal suspeito, Marcos Paulo diz ter ficado sem reação. “Fiquei muito surpreso, porque era uma pessoa que sempre estava ali na rua. Não éramos amigos, mas sempre dava bom-dia, boa-tarde, encontrava em alguma festa de fim de ano. Nunca imaginei que alguém tão próximo fosse capaz de fazer isso”, contou o vigilante, que relembrou a dissimulação de Almir Evaristo quando a polícia confirmou a morte de Noélia: “Ele me desejou os pêsames”.
Chefe da 38ª Delegacia de Polícia (Vicente Pires), a delegada Adriana Romana disse, no começo da tarde desta sexta-feira (25/10/2019), acreditar, com base nos elementos recolhidos até agora, que o operário de máquinas planejou assassinar Noélia provavelmente porque ela teria tentado colocar fim ao suposto relacionamento.
Almir foi preso nessa quinta-feira (24/10/2019). Ele não confessa o feminicídio. No entanto, segundo a PCDF, as investigações o colocam na cena onde Noélia foi achada morta com um tiro no rosto, no Assentamento 26 de Setembro, em Vicente Pires. De acordo com a delegada, antes de ser encontrado pela polícia, o operador de máquinas apagou todas as mensagens de seu celular, que foi apreendido. Mas os registros de ligações trazem evidências claras, segundo as investigações: o último contato telefônico de Noélia foi com o suspeito.
Adriana Romana ressalta ainda que Almir foi o último a ver Noélia com vida, na quinta-feira da semana passada (17/10/2019). A polícia faz uma varredura para tentar achar o celular, a bolsa da vítima e a arma usada no crime, inclusive na área onde a comerciária foi encontrada morta. Almir está em prisão temporária de 15 dias, e a polícia tenta revertê-la para preventiva. Adriana destaca que os policiais querem ouvi-lo novamente, para entender a motivação do crime. “Até agora, o investigado decidiu usar o direito de permanecer calado”, comentou a delegada.
De acordo com Adriana, o depoimento inicial de Almir foi de total negação. Em um segundo momento, ele chorou muito. Ao contrário da polícia, a família de Noélia suspeita que Almir tenha premeditado o crime. Sobrinho da vítima, Marcus Aurélio Silva de Oliveira, 27, crê que o vizinho foi encontrá-la com a intenção de matá-la.
“Temos a certeza que ele saiu brutalmente preparado para ceifar a vida dela”, ressaltou Marcus, um dia após a prisão de Almir. O sobrinho também rebateu comentários de pessoas nas redes sociais que criticam a hipótese de Noélia ter se relacionado com o suspeito, mesmo sendo casada. “Desonram a imagem da minha tia. Ela faleceu, não tem mais poder de voz. Então, pedimos para que pelo menos respeitem a memória dela.”
O sobrinho de Noélia ressalta que “nada justifica” a morte de sua tia. “Foi um crime banal. Os comentários machistas a respeito da vida íntima dela, o que tinha, o que não tinha. O que sei é que ela foi calada da forma mais cruel e que a gente não poderia esperar”, lamentou.
Ligações telefônicas
Segundo a delegada, vítima e criminoso se conheciam: “A gente conseguiu identificar que ela e o autor mantinham contatos diários e frequentes há quatro meses. Ele buscou Noélia na via do Eixo Monumental, próximo ao Brasília Shopping, e depois seguiu para o assentamento. Ainda não soubemos se ela foi morta no veículo”, explicou Adriana Romana.
“Tivemos acesso aos extratos das ligações telefônicas dela. Nesses documentos tinha ligações entre ela e o autor por quatro meses”, pontuou a investigadora. “Eram ligações que duravam mais de uma hora”, completou.
Outra linha de apuração que reforçou o nome de Almir Evaristo como assassino da vendedora foi o fato de os investigadores terem refeito o caminho percorrido por Noélia. “A gente conseguiu refazer todo o trajeto dela. Ela vai pelo Setor Hoteleiro e para em um arbusto. Essa foi a última imagem que conseguimos dela, bem próximo à parada.”
Confira os últimos momentos de Noélia com vida no Setor Hoteleiro Norte:
